2020: o Ano Que AINDA Não Acabou
24 de março de 2020, primeiro dia do lockdown contra o vírus do Covid – uma semana após a confirmação da primeira morte pelo vírus no país e algumas semanas após o fim do carnaval. De início, pensávamos que a quarentena seria “só quarenta dias”. Antes fosse: nessa brincadeira, ficamos quase dois anos enclausurados em casa e/ou tomando medidas sanitárias para sair e entrar em estabelecimentos: máscara, teste com aquele cotonete gigante horrível, evitar contato físico.
2020: O Ano Que Ainda Não Acabou Em 3 Atos
De lá pra cá, nosso estilo de vida e de trabalho mudou, por óbvio. Medidas que há muito estavam sendo ensaiadas no mundo corporativo, foram implementadas à toque de caixa: home office, reuniões virtuais (infinitas), acompanhamento de metas real time, contratação de funcionários que vivem permanentemente em outra região. As empresas também perceberam que muita gente que estava contratada não precisava estar ali. E muita gente que estava no corporativo descobriu que não queria/precisava estar ali: teve gente que virou nômade digital ou freelancer. Inclusive isso tem impactado a dinâmica no mercado de trabalho americano.
Ato I: Emprego. Quando o desemprego disparou nas primeiras semanas da pandemia, muitos temeram uma repetição da longa e lenta recuperação da Grande Recessão: anos de desemprego que deixaram muitos trabalhadores com cicatrizes permanentes. Em vez disso, a recuperação no mercado de trabalho tem sido, em muitos aspectos, a mais forte de que há registro.
Não existe ainda um consenso sobre a resiliência do mercado de trabalho americano – um dos balizadores das atitudes do Banco Central daquele país, por óbvio – mas um fator que tem sido unanimidade entre os especialistas é o papel que o trabalho remoto tem desempenhado nas escolhas de emprego: é como se o home office fosse um benefício não pecuniário para o trabalhador, que por vezes prefere escolher um trabalho que pague menos, mas que dê a liberdade de trabalhar de casa. Se é verdade ou não, é uma história interessante e que os especialistas ainda estão discutindo.
Ato II: Inflação. Uma das coisas que surpreende sobre a resiliência do mercado de trabalho americano é que ela ocorre em meio a uma taxa de inflação alta para os padrões americanos. Geralmente isso implicaria em empresas demitindo para conter custos e as pessoas consumindo menos, mas não é isso que vem ocorrendo. Aqui também pode ser a história do trabalho remoto, não há um consenso.
Mas é só olhar os dados que a gente vê que a inflação anual subiu de menos de um dígito para dois dígitos em menos de um ano lá nos EUA – mesmo fenômeno foi observado em outros países desenvolvidos.
Se para os brazucas inflação anual ao redor de 10% é suave, para gringo isso é motivo de cair os cabelos. O mundo desenvolvido não está acostumado a ir ao supermercado e ver que os produtos subiram de preço de uma semana pra outra.
Aqui, novamente, reminiscências de 2020 e da pandemia global. Primeiro, é lembrar que quando tudo estava envolto de incertezas e não sabíamos se a pandemia duraria um mês, dois meses ou anos e o que as empresas fariam a respeito da parada na atividade produtiva e com seus funcionários, muitos simplesmente enviaram cheques para a casa dos seus cidadãos. Alívio para alguns que perderam seu emprego, farra para outros: casos de pessoas que recebiam cheques do governo americano e corriam para o Walmart para comprar uma TV nova.
Fato é: o dinheiro enviado para as pessoas não só ajudou aquelas que perderam seu emprego a manter a comida na mesa, como também possibilitou o aumento do consumo de muitos que não estavam tão necessitados assim. E o que acontece quando o consumo acelera? A boa e velha inflação.
Adicione a esse fato choques do lado da oferta: além da parada na atividade produtiva (afinal, o contato físico deveria ser reduzido e os funcionários deveriam cumprir a quarentena), que incluía atividades que uma vez paradas demoravam meses para retomar a capacidade anterior (exemplo: siderúrgicas), tivemos a belíssima sorte de um navio gigantesco entalar no Canal de Suez, local que passa cerca de 12% do comércio mundial. Caos na logística mundial – navio Ever Given, quem lembra?
Pressão nas margens dos fornecedores, preços para cima. Inflação. Nessa brincadeira, estamos até hoje decidindo se é hora de baixar os juros, depois que eles subiram rapidamente para conter a inflação galopante.
Ato III: Redes Sociais e Mercado Financeiro. Sabe outra consequência do governo americano mandar cheques para casa das pessoas? As pessoas pegaram esse dinheirinho e colocaram para rodar no home broker. Muitos, inclusive, nunca tinham operado no mercado financeiro, mas ali em casa sem nada para fazer e com dinheiro “de graça”, porque não tentar a sorte, não é mesmo? Qualquer coisa, é pedir dicas nesses fóruns de internet…
E foi num desses fóruns que um evento que já entrou pra história do mercado financeiro mundial aconteceu: o short squeeze da GameStop ($GME).
O short squeeze da GameStop ocorreu em janeiro de 2021, quando investidores individuais, coordenados por meio de fóruns online como o Reddit, como o subreddit WallStreetBets, decidiram comprar ações da GameStop em massa, provocando um aumento significativo no preço das ações. Isso ocorreu principalmente porque grandes fundos de hedge haviam vendido ações da GameStop a descoberto – ou seja, apostado que o preço das ações iria cair.
Com o aumento repentino no preço das ações, esses fundos foram forçados a recomprar as ações para cobrir suas posições curtas, alimentando ainda mais a alta dos preços. As consequências financeiras incluíram perdas substanciais para alguns fundos de hedge, ganhos para os investidores individuais envolvidos no short squeeze e uma reavaliação do papel das mídias sociais e dos investidores de varejo no mercado financeiro. Além disso, houve discussões sobre a necessidade de regulamentação mais rigorosa em torno das práticas de negociação de ações e da transparência do mercado financeiro.
O evento da GameStop, assim como os outros eventos citados aqui, são só um símbolo: sinal da consolidação do investidor pessoa física como figura relevante e do poder das redes sociais em fazer preço. Enquanto estávamos todos ali, assistindo lives sertanejas e acompanhando Big Brother, aparecem uma ou outra figura falando de Bolsa de Valores e mercado financeiro. Meio que com o “vou colocar um dinheiro e ver no que dá”, o investidor pessoa física descobriu a bolsa de valores e por lá permaneceu. Claro, nessa brincadeira toda, tiveram papel relevante os educadores financeiros (às vezes, nem tão educadores assim) e os finfluencers, que mostrando na prática como transfere o dinheiro da conta corrente para uma conta na corretora e como se compra uma ação, levou um número relevante de pessoas para o maravilhoso mercado financeiro.
E as instituições reguladoras se deram conta disso: semana passada saiu um manual da ANBIMA sobre as melhores práticas de finfluencers. Não sem tempo: em meio a promessas de retorno garantido, indicações duvidosas de ativos sem um disclosure claro dos custos embutidos e outras práticas duvidosas, esse foi mais um movimento de figuras institucionais em reconhecer que o mercado financeiro mudou: agora, muitos dos movimentos importantes de mercado não acontecem em salas fechadas de prédios espelhados, mas sim uma um vídeo viral ou de um tweet de rede social. Hábitos herdados e/ou aprofundados enquanto estávamos aquartelados em casa. 2020: o ano que ainda não acabou.
Os eventos que ocorreram ao redor do início da pandemia tiveram forte impacto sobre o preço das ações - naturalmente, afinal, uma pandemia global tem um poder enorme de destruição de riqueza. Por isso mesmo, os melhores profissionais ficaram de olhos atentos acompanhando constantemente o cenário e os indicadores financeiros (em especial, os futuros).
Um excelente hábito para um investidor ter é acompanhar o site da Inteligência Financeira, que ajuda a navegar no mundo dos investimentos e entender o que faz preço no mercado. Notícias de última hora do mercado e análise feitas por especialistas em investimentos, além de conteúdos exclusivos com grandes nomes do mercado.
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