O Mercador de Veneza é uma obra clássica de William Shakespeare e que é duplamente excelente porque além do livro, ainda temos a clássica versão em filme com o genial Al Pacino. Além disso, traz alguns insights interessantes e mostra na prática aquilo que a gente vive falando de “skin in the game”.
A história se passa nos anos dourados de Veneza, uma cidade-estado italiana muito rica devido ao comércio, sendo a ponte entre as riquezas do Ocidente e do Oriente. Essa intermediação é realizada por mercadores como Antônio, dono de navios que realizam esse comércio.
Antônio é amigo de Bassânio, um herdeiro que já gastou mais do que devia e vive pedindo ajuda financeira ao amigo Antônio. Acontece que Bassânio ficou sabendo que longe de Veneza, em uma cidade do continente chamada Belmonte, vive uma bela donzela chamada Pórtia, dona de um grande dote. O plano de Bassânio é ir até Belmonte, fazer a corte e pedi-la em casamento. Para isso, ele precisa de dinheiro para a viagem, roupas novas, presentes para a herdeira, e muito mais. Tudo para demonstrar ser um pretendente à altura da Pórtia. Com o dinheiro do dote, Bassânio pretende pagar as dívidas com o amigo e ainda viver muitos anos com a fortuna de Pórtia.
Acontece que todo o dinheiro de Antônio encontra-se investido em seus navios, que estão em alto mar. Porém, para não deixar seu amigo na mão, Antônio oferece ser fiador de Bassânio. Bassânio consegue dinheiro emprestado com um inimigo de Antônio, o judeu Shylock: 3.000 ducats por 3 meses. E uma multa de inadimplência ao contrato: 1 libra da carne de Antônio, que seria cortada pelo próprio Shylock. O mercador aceita o contrato, pois está confiante no retorno de suas embarcações. Skin in the game, literalmente.
Empréstimo feito, Bassânio vai em busca de sua donzela e o mercador Antônio volta-se para suas embarcações. Porém, como se fosse uma brincadeira do destino, as embarcações começam a afundar. Ao final dos três meses, o empréstimo não tem condições de ser pago e o contrato vai à execução.
O genial Al Pacino como o judeu Shylock
O final, caro leitor, você só saberá se assistir o filme. Recomendamos fortemente, pois é mais um show de atuação de Al Pacino nessa que é uma das obras mais conhecidas de Shakespeare.
Porém, uma coisa no filme chama atenção: Antônio era inimigo do judeu Shylock e mesmo assim aceitou um contrato de empréstimo que caso não fosse honrado, teria como multa um pedaço da carne do próprio Antônio. E o mesmo aceitou, confiante no retorno de seus navios. Aceitou mesmo sabendo que navios mercantes são suscetíveis a naufrágios.
Por ser um veterano em sua função, Antônio usou do seu conhecimento adquirido nos negócios para crer que não haveria chances de perder tantas embarcações a ponto de não pagar o empréstimo e perder uma tira do seu próprio couro. E errou.
O que leva uma pessoa a arriscar, como Antônio arriscou? Quais são os cálculos envolvidos e como é esse processo de decisão?
Para a primeira pergunta, há muitas respostas: a personalidade (ser uma pessoa que não tem medo do risco), a condição financeira (ter onde se apoiar caso falhe), a falta de condição financeira (não ter nada a perder), o conhecimento (por achar que sabe onde está se metendo), a falta de conhecimento (por justamente não saber de todos os riscos), os hormônios (existe uma teoria que diz que a testosterona -- presente em homens e mulheres -- está ligada à tomada de risco), o ambiente (se propício à tomada de risco ou não) e por aí vai…
Para a segunda pergunta, a resposta está mais ou menos ligada à primeira: às vezes não tem cálculos (o bom e velho “vai na fé”), às vezes é baseado na experiência (como no caso de Antônio), pode ser também fruto de um estudo/planejamento… E mesmo assim, mesmo com todo o planejamento e sabedoria do mundo, podemos estar errados. Como o mercador de Veneza.
Estamos cheios de casos de tomada de riscos que deram certos, e outras que deram erradas. Nas que deram certo, temos por exemplo a famosa aposta de George Soros contra o Banco da Inglaterra, que garantiu ao húngaro embolsar mais de 1 bilhão de libras em um único negócio. Também o nosso meme lord favorito, Elon Musk, que criou uma empresa de meios de pagamentos digitais antes mesmo da internet ser presente na vida das pessoas, depois chegou a morar no escritório porque estava com pouco dinheiro, e hoje é um dos homens mais ricos do mundo.
Na ponta perdedora temos o caso de Jérôme Kerviel, que quase quebrou o centenário francês Societé Generale. Igualmente retumbante é a ascenção e queda do Visconde de Mauá, que construiu do nada um dos maiores conglomerados empresariais na história do Brasil, mas que acabou terminando a vida vendo suas empresas indo à falência.
A conclusão disso tudo? Que vocês tem que assistir o filme O Mercador de Veneza com o genial Al Pacino.
Aproveitando a deixa
E já que estamos falando de tomar risco...
Esse é aquele tipo de livro que separa quem realmente gosta de mercado financeiro ou não. Se você ainda não leu esse clássico, temos um problema.
Bernstein foi o primeiro a registrar a história sob o ponto de vista do risco, foi uma verdadeira revolução para a sociedade passarmos a utilizar probabilidade, cenários e modelos.
Então, os deuses e oráculos antes responsáveis pelo nosso futuro, pouco a pouco, foram perdendo importância. Veja a lista completa de livros indicados pelo Faria Lima Elevator na Biblioteca do Condado.
Skin in the game em dólares
Títulos de renda fixa privada são ativos bastante populares nos Estados Unidos. Apple e Meta, por exemplo, não emitem só ações, é possível comprar títulos de dívida dessas empresas e ser credor dessas big techs e receber um jurinhos em dólar. "Jurinhos" e "dólar", inclusive, são duas palavras que brilham o olho de qualquer investidor, e colocar em carteira ativos que reúnem essas duas palavras ficou mais fácil, pois a Avenue reduziu a aplicação mínima para bonds americanos, além de dar acesso a várias opções de investimentos internacionais. Saiba mais aqui.
Muito bom, mas não entendi por que você não recomendou também a leitura da peça de Shakespeare.
Pelo post e obrigado por nao dar spoiler! Vou tratar de ver esse filme.