É Mais Fácil Controlar Os Custos
Jack Bogle (1929-2019) foi um veterano do mercado, uma pessoa que não só revolucionou o mercado financeiro, como também permaneceu no game e na vanguarda da inovação financeira por muitos anos. Ele foi nomeado um dos 4 “gigantes do século 20” da indústria de investimentos pela revista Fortune e recebeu o Lifetime Achievement Award da Institutional Investor.
Começou sua carreira em 1951 na Wellington, logo após ter se formado, chegando à posição de CEO da empresa em 1970. Pensa que tudo foram flores e acertos na vida de Bogle? Nada disso: foi demitido em seus primeiros anos de CEO, após um negócio mal sucedido da empresa. Poderia ter sido o início do fim de uma carreira, mas Jack analisou o caso da seguinte forma: "O bom desse erro, que foi vergonhoso e indesculpável e reflexo de uma imaturidade e confiança para além do que os factos justificam, foi que aprendi muito". O tal do mindset de crescimento que os psicólogos gostam de apontar nas figuras que conseguem se superar.
Alguns anos depois, em 1974, Bogle fundou o The Vanguard Group, criando o primeiro fundo de índice em 1976, chamado Vanguard S&P500 Index Fund. A Vanguard não precisa de apresentação: uma das maiores companhias de investimentos do mundo, com cerca de US$ 8 trilhões de ativos sob gestão globalmente e uma das maiores especialistas em fundos indexados e ETFs.
Durante toda sua vida, Bogle foi um forte defensor do pequeno investidor, autor de vários livros sobre investimento e ganhou vários prêmios de prestígio. Só para ter uma ideia deste prestígio: na famosa Reunião Anual da Berkshire Hathaway, em 2016, Buffett e Munger subiram ao palco e compartilharam um resumo dos resultados daquela ano da empresa. Enquanto Warren fazia seus comentários iniciais, Buffett começou a falar sobre Bogle – que havia sido levado por amigos ao evento. Buffet começou a dizer: “Jack Bogle provavelmente fez mais pelo investidor americano do que qualquer homem no país”. Ele então pediu a Bogle que se levantasse sob uma onda de aplausos do público. Buffett explicou o papel proeminente de Bogle no investimento pioneiro em fundos de índice e elogiou Bogle por ser “o maior amigo dos investidores americanos".
Um dos pontos que Bogle sempre bateu foi a questão dos custos de investimentos: para o americano, muito além de se preocupar com o retorno e do risco dos investimentos – elementos fora do controle imediato dos investidores – era preciso se preocupar com o custo das operações. Bogle, em 2018, observara que as taxas dos fundos mútuos estavam em cerca de 70 bps (100bps equivalem a um 1%) em média. Essa taxa aplicada em uma indústria de US$ 18 trilhões, equivale a US$ 126 bilhões apenas em taxas – uma quantia impressionante de dinheiro para fundos que raramente superam o índice. Em comparação, os investidores de fundos de índice pagam apenas cerca de 4bps e reinvestem suas economias.
Se compor esses valores por 50 anos, os investidores de fundos de índice terão ganhos três vezes maiores do que aqueles que investem em estratégias ativas: é possível obter 3 vezes mais capital apenas tirando o custo da equação. Era essa a batalha que Bogle escolheu pra si e, como disse: “Se pudéssemos levar essa mensagem a todos, teríamos uma verdadeira revolução”.
Além dos livros que escreveu, o investidor concedeu várias entrevistas ao longo de sua vida, momentos onde era possível dissecar um pouco da mente do veterano. Há muitas entrevistas interessantes mas, em especial na questão de como os custos afetam os investimentos. Uma vez, perguntado sobre um livro que publicara (“The Clash o Cultures”) e perguntado sobre o “quociente de administração” e outros critérios que achava que qualquer empresa administradora de dinheiro deveria ter e as principais coisas em que os investidores deveriam se concentrar ao avaliar a qualidade da administração da empresa de fundos, Bogle respondeu:
“Por administração, só para ficar claro, quero dizer até que ponto a empresa está colocando os interesses de seus acionistas de fundos mútuos à frente dos interesses de seus administradores? E isso se resume, em muitos aspectos, a questões de custo. Então, você começa com índices de despesas; se estiverem muito altos, os diretores não estão fazendo seu trabalho. Eles devem ser competitivos ou baixos; talvez muito mais baixos. Infelizmente, ninguém pode alcançar o Vanguard, e estamos começando a dirigir um pouco nós mesmos de qualquer maneira. Mas esse é o número um.
Número dois, eles devem se concentrar em estratégias de investimento de longo prazo, não em estratégias especulativas de curto prazo. Eles devem estar investindo com prudência. Você pode medir isso um pouco pela taxa de rotatividade do portfólio. O giro médio de uma carteira de fundos mútuos neste negócio hoje é de quase 100%, o que significa que eles mantêm o estoque médio por um ano. Isso é inequivocamente especulação e custa dinheiro. É dinheiro escondido, mas eles nunca dizem - ninguém diz - você basicamente não sabe com números firmes. Mas o custo disso não é revelado. Eu uso uma regra de cerca de 0,5%-1,0% do volume de negócios. Então, se você virar 100%, esses custos são de 50 pontos-base a 100 pontos-base por ano. Bem, em alguns casos isso é maior do que o índice de despesas do fundo. Então isso é um grande fator.”
Depois dessa resposta, talvez você entenda porque Buffett disse que “Jack Bogle provavelmente fez mais pelo investidor americano do que qualquer homem no país”: ninguém foi mais vocal e preciso na luta contra os altos custos de investimento e na oferta de alternativas mais baratas do que Bogle. E se você entendeu isso, também deveria entender o porquê de sua luta: retornos e risco você consegue estimar, mas não estão totalmente sob seu controle; custos, por outro lado, é uma variável que está sob seu controle e você, definitivamente, deveria se importar.
Frase da Semana
“O Brasil tem preferido a proteção destrutiva à destruição criativa e os resultados estão à nossa volta”
Mário Mesquita, economista.
Economia e Mercado
Nessa semana o mercado voltou a lembrar que um ambiente de recessão americana é, de fato… uma coisa ruim. Depois de ter comemorado resultados ruins na americana, reprecificando ciclo de juros, não tem muito mais o que ajudar o mercado de equity US depois de resultados mais fracos no mercado de trabalho. Os lucros serão revisados para baixo e o mercado precifica negociar em outros preços. E parte da janela de juros já foi precificado, ou seja, o que poderia ajudar, já ajudou. Ninguém sabe a velocidade, mas apenas que deve acontecer.
No caso de Europa, a conversa está mais light. Basicamente a mercê do que acontecer nos EUA, ou seja, mais um grande refém nesse jogo. A vontade do ECB é continuar subindo juros e as economias estão dando sinais mais fortes no 1T23, não parece a desaceleração vista em US no mês de março. A ver.
Já China segue a todo vapor. A economia doméstica continua se recuperando, em breve vamos saber o resultado final do PIB do 1T23, mas parece algo bom. Mercado deve voltar a olhar com carinho depois de reduzir posição em mercados emergentes por conta do medo de um credit crunch nos EUA. E aqui falo dos emergentes que realmente importam, os Asiáticos.
O Brasil segue de lado e de lado ficará. Todas as cartas de gestores comemorando que o arcabouço fiscal não é uma completa catástrofe pois mostra alguma intenção de gerar primário positivo e estabilizar a dívida, mas ninguém ainda conseguiu explicar as contas, sobretudo se a ideia de arrecadação com o ICMS der errado. Dá onde viria o dinheiro? o governo teria culhão para o ajuste de 0.5x receita em ambiente de crise ou eleitoral? E mais do que isso, todo mundo sabe que o juro fechou aqui porque a curva americana foi amassada - quase 100 bps em vértices importantes - e o mercado de renda fixa teve um rally. Não sejam ingênuos de achar que a curva fechou aqui totalmente pela benevolência do mercado em relação ao novo plano fiscal. Se tivesse estressado lá fora, com Powell entregando os 50 bps que prometeu no início de março e não tivéssemos problema nos small banks, a curva aqui estaria pressionada e provavelmente o mercado estaria achando ruim o arcabouço. Enfim, podemos de enganar por um tempo, mas não podemos nos enganar o tempo todo.