Sejam bem-vindos a mais uma Carta do Condado! A Encíclica mais esperada do Condado da Faria Lima, sua dose semanal de conhecimento com umas pitadas de humor mais umas pitadas de finanças.
Na Carta deste final de semana, adicionamos mais uma pitada de pimenta, para combinar com o clima que vai se formando em um horizonte não tão distante: as eleições americanas e uma provável volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos da América. Bem, ao menos é isso o que apostam os mais altos especialistas no tema.
Mas o amigo ou amiga que nos lê já se perguntou qual o impacto que têm as eleições americanas para o resto do mundo?
Pax Americana. Você já deve ter ouvido esse termo - se não, certifique-se de melhorar suas fontes. Trata-se da supremacia dos Estados Unidos da América nos mais diversos setores: econômico, cultural, político, militar... Mesmo os mais velhos de hoje devem ter poucas recordações de como o mundo era sem a influência americana nos filmes, no modo de vida, na cultura e no bolso. Não tem como: o exército americano funciona como polícia mundial, o que Hollywood quer que seja tendência vira tendência, e Wall Street tem poder de definir os rumos dos mercados globais.
A segunda guerra mundial marcou não somente a vitória dos Aliados (EUA, União Soviética (URSS) e Reino Unido, principalmente) contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão, principalmente), mas também uma reorganização dos poderes no mundo e a ascensão dos EUA e União Soviética como potências (por um tempo rolou uma competição entre as duas potências - a chamada Guerra Fria - mas na década de 90 tivermos o esfacelamento da URSS e a consolidação do poderio americano). Muitas organizações internacionais foram criadas com o intuito de manter a paz e o funcionamento nesse novo sistema geopolítico, todas sob o controle dos vencedores da II GM - já viu quem são os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU?
No campo político-econômico também rolaram alterações, e talvez a mais importante tenha sido a Conferência de Bretton-Woods. Além da criação de organismos como o FMI, a conferência também definiu um sistema fixo de paridades entre as moedas nacionais e o ouro e uma medida base, que seria o padrão dólar-ouro, em que 35 dólares valeriam uma onça-troy (uma medida de peso) do metal precioso. Até então, o comércio entre os países era na base do padrão-ouro, em que os países trocavam mercadorias usando o ouro como moeda de troca. No novo sistema, o ouro ainda era moeda de troca (assim como algumas moedas mais líquidas, como o pound britânico, franco francês e o próprio dólar americano), mas passou-se a ter o dólar como referência mundial para as demais moedas.
Esse sistema durou até 1971, quando o presidente americano Richard Nixon decidiu abandonar unilateralmente o padrão dólar-ouro e deixar o dólar flutuar em relação ao metal. Em seguida, outros países abandonaram o câmbio fixo em relação ao ouro, e passaram a ter o dólar americano como referência para suas moedas. Esse movimento coroou a moeda americana como a moeda do comércio e trocas internacionais. Bem, se a sua moeda é usada como referência para troca entre outros dois países, muito ruim isso não pode ser, não é?
E não é. O dólar americano passou a ser a forma como os países calculam suas trocas (de bens, serviços, capitais, etc) e como guardam suas reservas (em qual forma estão as reservas brasileiras? Aliás, em que nível elas estão?), tornando-se uma moeda fiduciária mundial. Fidúcia vem do latim fidere, quer dizer confiar. O dólar é um pedaço de papel, mas nós confiamos. E por quê? Bem, por muitos motivos, dentre eles: é emitido pela maior potência (não somente economia, também potência) mundial, é amplamente aceito em vários lugares do mundo, quem está emitindo essa moeda não só tem um dos maiores estoques de reservas mundiais de barras de ouro (Fort Knox) - ou seja, embora não tenha uma paridade fixa com o ouro, no limite, os EUA seriam capazes de trocar os dólares de quem quisesse sua parte em ouro, se fosse possível realizar essa troca.
(Trivia: os EUA são depositários das reservas de barras de ouro de muitos países europeus, que acharam mais seguros deixá-las em território americano, enquanto a II Guerra Mundial acontecia no Velho Continente. Ser depositário das reservas de outro país, em tese, é só guardar o ouro de outro país, devolvendo quando for solicitado, correto? Mais ou menos, nao foi bem isso que aconteceu quando Maduro tentou quer sacar o ouro venezuealno dos cofres do Banco Central da Inglaterra, eram 31 toneladas.)
E o que Trump tem a ver com isso? Só por que tem eleições nos EUA jajá? Mais ou menos. Uma das bandeiras levantadas pelo candidato republicano ao longo de seu primeiro mandato foi a trade war com a China. Cada tweet que o presidente americano publicava, os mercados globais sacudiam sob a incerteza de como ficaria o comércio com o gigante asiático e o comércio global como um todo. E por que o alvo a China, e não uma Índia ou Alemanha da vida? Segundo Trump, o comércio com a China tornou-se muito desvantajoso para a potência americana, e precisava ser revisto. Mas o fato é: nos últimos 30 anos a China passou de uma país fechado, rural e com uma indústria pequena, para uma das maiores economia do mundo, com altas taxas de urbanização, que alia mão-de-obra barata com indústria de ponta e que passou de um mero coadjuvante no bolo dos países em desenvolvimento para a segunda maior economia mundial.
E por que a China crescer incomoda tanto os EUA e sua hegemonia mundial? Por que parece que agora a China quer sentar no painel de controle mundial também. Aliás, chegou quem são os países do Conselho de Segurança permanente da ONU, como a gente falou ali em cima? Esse poder vem desde o final da II Guerra Mundial, mas agora a China conta não somente com um poder militar, como seu poder econômico fica cada vez mais forte, e os EUA estão sentindo que sua hegemonia fica cada vez mais ameaçada. Um exemplo banal: o TikTok. Acostumados aos aplicativos americanos, o aplicativo chinês virou febre nos Estados Unidos, sendo inclusive ameaçado de banimento por parte do presidente americano, sob acusação de ser instrumento de espionagem de Pequim. Parece que o jogo virou, né não? E nessa linha, temos vários exemplos de como a China tem incomodado: tecnologia 5G, vacina para o Covid, chips semicondutores, carros elétricos…
Além disso, as instituições do pós-Guerra, como a ONU e a OMC (Organização Mundial do Comércio) têm perdido cada vez mais seu poder de balizador mundial das decisões, o que tem levado muitos países a adotar medidas uni ou bilaterais de comércio e política. Seria o início do fim do mundo como conhecemos? Cenas dos próximos capítulos.
A real, caros leitores, é que o mundo sempre viveu sob um sistema de hegemonia, abaixo de uma ou algumas potências:
Antes dos EUA, foi a vez dos britânicos - ou, a Pax Britannica. Entre cerca do início do século XIX e 1945 o mundo vivia em função do que ocorria na velha ilha britânica. Foi crucial para esse período a Revolução Industrial que ocorreu por lá e foi potencializada com as colônias ao redor do mundo: dizia-se que o sol nunca se punha sob o território Império Britânico, já que tinham colônia do extremo oriente ao novo mundo ocidental. Não é por acaso que a Inglaterra/Reino Unido é tão rica e o Inglês ser a "língua mundial".
Antes dos britânicos, entre os séculos XVII e XVIII, foi a vez dos franceses, em grande parte devido às Guerras Napoleônicas e o espólio do império Espanhol. Foi um período relativamente curto - tanto que nem existe um termo “pax francesa” - mas por ter se erguido sobre os escombros do império Espanhol, teve grande alcance mundial. Que já leu os livros do escritor português Eça de Queirós, sabe que os Enzos e Valentinas da época eram mandados para estudar na França, e não na Inglaterra ou outro país rico.
Antes dos franceses, entre os séculos foi a vez dos Espanhóis, que deram um by-pass nos Portugueses e se tornaram os donos do jogo com as colônias do Novo Mundo. E dos Portugueses… Bem, dos portugueses você deveria saber. Se não fossem eles, não estaríamos aproveitando as praias do Trópico de Capricórnio.
E antes do Espanhóis e Portugueses: era tudo mato. Ou quase. Foi o período da Idade Média, que a Europa estava dividida em pequenos reinos e com problemas demais para pensar em querer mandar em alguém fora de casa – na verdade, cada reino estava lutando para não ser invadido e dominado por um povo estrangeiro..
O termo Pax Americana remonta originalmente ao termo Pax Romana, um dos exemplos mais próximos do que podemos chamar de “império” “mundial”. Conforme a figura abaixo, estava mais para império europeu-com-um-pé-na-África-e-outro-no-Oriente-Médio, mas graças à contribuição da potência para o mundo ocidental como é hoje, damos esse destaque. O Latim, que era a língua governamental do Império Romano (saudades…) deu origem à diversas línguas europeias, como o italiano, francês, romeno e até no português.
Com que frequência você pensa na queda do Império Romano?
O que o mapa acima não mostra é que do outro lado do mundo, também havia um império que tinha controle sobre grande parte da Ásia mais ou menos no mesmo período da Pax Romana.
Sob a dinastia Han, houve a aglutinação de uma grandes territórios no leste asiático sob as ordens de uma só figura, o que levou ao termo Pax Sinica. O que se observou após o Han foi um vai-e-vem de poderes e extensão e redução de territórios, de forma que o gigante chinês sempre ficou mais voltado para dentro e para os problemas internos.
Não é só Donald Trump que gosta de muros para defender seu país, os Ham também adotaram essa medida contra invasões estrangeiras
Mas parece que a China, desde Mao Tsé-Tung, tem arrumado a casa e começado a reivindicar seu lugar na mesa das decisões mundiais.
Depois de tudo que foi escrito nessa carta, fica a pergunta: será que um dia usaremos o Yuan como moeda de trocas internacionais? Uma coisa é fato, se um dia o mandarim se tornar a linguagem mundial dos negócios, sentiremos falta das aulas com o verbo to-be.
Enquanto isso, todos de olho nas eleições americanas.
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