Ninguém Quer Ficar Rico Devagar
Essa semana terminou com o clássico das maiores torcidas de futebol do Brasil: Flamengo e Corinthians duelaram pela taça da Copa Brasil. O time carioca levou a melhor: do empate no tempo regular, a cobrança de penalties deu o caneco para o rubro-negro.
Além da vitória do Mengão, para a alegria dos lebloners, outra coisa nos chamou atenção: os patrocinadores do time. Além das tradicionais patrocinadoras, como construtoras e lojas de varejo, o time carioca tem como patrocinador uma empresa de apostas.
Na verdade, até a Libertadores tem como um de seus patrocinadores uma empresa de apostas. E isso diz muita coisa.
Patrocinar grandes eventos e times de primeira linha custa caro, tem que ter bala na agulha – e essas empresas estão com os bolsos cheios de dinheiro. Basta uma pesquisa rápida pela internet e você vê que é possível apostar em resultados de jogos de futebol e até de resultados de eleições.
Mas, muito melhor do que entender a oferta desses serviços, é entender a demanda: as pessoas simplesmente gostam de apostar. E você sabe disso: bolão da Copa e Mega Sena da virada são parte essencial da experiência de ser brasileiro.
E foi pensando nisso que o pesquisador americano Alok Kumar se perguntou: se as pessoas, ao investirem na bolsa, também têm um comportamento de apostadores de loteria (em oposição a um comportamento de pessoas que investem pensando exclusivamente nas empresas e seus indicadores, por exemplo).
A conclusão foi a seguinte: as pessoas físicas, em oposição aos investidores institucionais (bancos, corretoras e afins) são mais propensas a comprar ações que se comportam como bilhetes de loteria.
Os bilhetes de loteria têm um preço relativo menor que o valor do retorno potencial, com uma probabilidade extremamente pequena de uma recompensa muito alta, ou seja, eles têm retornos esperados negativos.
Fazendo um comparativo com ações, Kumar identificou ações que poderiam se comportar com bilhetes de loteria: ações com preços mais baixos com potencial pequeno, mas positivo, para altos retornos e com grande variância.
A conclusão? Que as pessoas que têm uma tendência maior a comprar bilhetes de loteria também tem uma tendência maior a comprar ações que se comportam como loteria (em oposição a ações com retornos menores e menos voláteis).
Em especial, homens de renda baixa têm uma maior propensão ainda a investir no estilo “aposta”, comprando essas ações que se comportam como “bilhetes de loteria”. Como Markowitz apontou, alguns investidores podem “assumir grandes chances de uma pequena perda por uma pequena chance de um grande ganho”.
Mas, e por que isso? Arriscar por arriscar? Falta de conhecimento? Maior gana de enriquecer rápido?
São muitas as linhas explicativas. Na verdade, nunca é apenas um fator que explica comportamentos como esses, são uma composição de fatores.
Uma dessas linhas explicativas, entretanto, é bem interessante. Interessante tanto pela ideia quanto pela forma que os pesquisadores tiveram para testar e provar essa linha explicativa.
Mark Grinblatt e Matti Keloharju, em 2009, pesquisaram o efeito que a “busca de sensações” e o excesso de confiança tem sobre os trades. A ideia inicial era a seguinte: será que o excesso de confiança e a “busca por sensações” afetam a forma como as pessoas negociam ações?
A “busca por sensações” é um traço psicológico ligado a apostar, direção arriscada, abuso de drogas e uma série de outros comportamentos – e é mais abundante nos homens. É a busca por aquela adrenalina ligada ao risco.
Grinblatt e Keloharju fizeram dois testes interessantes: usando dados da Finlândia, pegaram os dados de multa por velocidade (que são função da renda) e cruzaram com dados de negociação de ações, controlando para diversos fatores que poderiam afetar essa relação.
Descobriram que as pessoas que mais tomavam multa por velocidade, também tendiam a comprar e vender mais ações.
O racional é mais ou menos assim: a pessoa que busca adrenalina ao dirigir em alta velocidade, tende a tomar suas decisões de investimento influenciado por essa busca.
Além disso, Grinblatt e Keloharju tinham dados de testes psicológicos que podiam medir a confiança que as pessoas (no caso, homens em idade militar) tinham em si.
Cruzando com as informações de negociação de ações e controlando para diversos fatores, encontraram que as pessoas com maior “excesso de confiança” também tendiam a ter um maior volume de compra e venda de ações.
E sabe o que é mais interessante disso tudo? Que nos dois casos avaliados, de “busca por sensações” e de excesso de confiança, o alto volume de negociações levava a menores retornos da carteira: maior volume de negociação leva a custos certos, para ganhos (ou perdas) incertas.
Dos estudos, nós concluímos que uma boa gestão de ativos não é que nem Hollywood retrata nos filmes, ambiente frenético com decisões tomadas em frações de segundos. Pelo contrário: a rotina ideal de investimentos é uma rotina “chata”, com poucas e bem pensadas decisões.
Warren Buffett, por exemplo, explica que, na maioria dos dias, ele apenas fica sentado em seu escritório e lê o dia todo.
Falando do velhinho de Omaha, lembramos daquela história de quando Jeff Bezos perguntou a Warren Buffett: “Você é um dos homens mais ricos do mundo e, ao mesmo tempo, tem uma filosofia de investimento simples. Por que o mundo inteiro simplesmente não seguiu isso?”.
Ao que Buffett respondeu: “Porque ninguém quer ficar rico devagar”. Aparentemente, a receita do sucesso em investimentos é fazer as coisas “chatas”.
Frase da Semana
Algumas pessoas nunca cometem os mesmos erros duas vezes. Descobrem sempre novos erros para cometer.
Mark Twain, humorista.
Tópicos de Economia e Mercado
No meio de uma temporada de resultados, não precisaríamos esperar nada além de volatilidade e a volatilidade realmente apareceu. Movimentos de +2% e -2% nos índices agregados só mostram que as narrativas podem mudar de uma hora para outra e o mercado pode cair ou subir pelo exato mesmo motivo que o fez subir ou cair no dia anterior. Dito isso, a semana marcou surpresas positivas nos resultados e também em alguns indicadores econômicos americanos, caso da produção industrial. Tudo isso dificulta um pouco o trabalho do Fed, que precisa ver sangue, lágrimas e suor por parte do mercado para lá na frente começar a tirar o pé do acelerar e colocar o pé no freio. Devemos ficar nesse banho-maria até o final do ano.
Já na Europa a situação só piora. Chegamos a conclusão que claramente o Reino Unido é um país da América Latina que sem querer está na Europa. O mesmo vale para Itália. As economias estão acelerando o ritmo de recessão e a inflação não dá qualquer sinal de desafogo. Os Bancos Centrais até estão falando duro, mas a maior parte do mercado duvida que serão capazes de fazer muita coisa ou ir muito além sem deixar vários corpos no chão. Além disso, as estratégias em conjunto de limitar o preço do gás natural no principal benchmark da União Europeia é o tipo de coisa que parece inteligente, mas só afunda mais o buraco.
Na China, por sua vez, o Congresso acabou e, a bem da verdade, não trouxe nada de novo pensamento em mercados aqui no Ocidente. Não teve qualquer relevância para Brasil além de reafirmar que só um desinformado acreditou que a política de Covid zero ia ser reduzida ainda esse ano. Isso nunca foi um cenário com probabilidade razoável. Dito isso, no curto prazo não há qualquer chance do cenário de Covid mudar ou do setor imobiliário tomar um socorro ainda mais forte do que aquele que já tem. Não é um vetor que vai atrapalhar o Brasil, mas também não irá ajudar. É o que chamamos de neutralidade.
E falando em Brasil, claramente todos estão na espera da Eleição e da Copa do Mundo. Ficou chato acompanhar os mercados por aqui, assim como é chato acompanhar a temporada de resultados. O COPOM, que deve ocorrer em breve, vai vir com um tom duro, mas sem fazer exatamente nada e sem grande novidade, portanto, com menor importância que já teve no passado. O jeito é esperar o resultado no final do mês mesmo e depois começar a fazer conta de qual o tamanho do impacto fiscal, independente de quem vença, para os próximos anos. A única pergunta que ainda fica na minha cabeça: Como o Brasil, com a maior instabilidade fiscal e política do que pares desenvolvidos, vai conseguir convergir a inflação para a meta com o juros real significativamente elevado, sem gerar uma recessão? Seria um caso de estudo perfeito.