Para onde estão indo os bilionários?
Tem um ditado famoso entre os muito ricos que é mais ou menos assim: "primeiro você manda o dinheiro, depois você manda os filhos e depois você se manda". Pois bem, os que estão se mandando, estão se mandando para onde e porquê?
O famoso Henley & Partners Global Wealth Migration deste ano, lançado há algumas semanas, mostrou que o número total de HNWI (High-Net-Worth Individuals, pessoas com um patrimônio líquido muito elevado, geralmente com pelo menos $1 milhão ou mais em ativos) que se mudaram para um novo país desde 2013 (se mudaram e permaneceram no seu novo país por mais de seis meses) é o maior dos últimos 10 anos.
ATH na migração de pessoas HNWIs. Fonte: Henley&Partners
Houve uma trajetória de crescimento constante até 2020, quando a pandemia de Covid-19 dificultou a migração e o acompanhamento de milionários em movimento. A recuperação começou rapidamente em 2022, com fluxos migratórios recordes registrados em 2023. Os números provisórios de 2024 e as previsões para 2025 indicam um crescimento contínuo.
De onde tá saindo essa galera
O relatório é claro: essa migração é de cidadãos de países emergentes, com destaque especial para os HNWI chineses. A China está novamente no caminho certo para ser o maior perdedor milionário a nível mundial, com uma saída líquida prevista de 15200 HNWIs este ano.
Surpreendentemente, a segunda posição é ocupada pelos britânicos: 4300 HNWIs deverão deixar o país em 2024 (em comparação com 5100 no ano passado) – ainda os efeitos do Brexit, mas também da elevação de impostos e do percebido aumento da violência nos grandes centros.
Já a Índia estancou o seu êxodo de riqueza e ficou em terceiro lugar, depois de anos em segundo, após a China. Também é esperado que os HNWI da Coreia do Sul saiam com uma perda prevista de 1200 milionários (em comparação com 800 em 2023), enquanto o tsunami de milionários que fugiram da Rússia após a eclosão da guerra na Ucrânia parece estar diminuindo, com apenas 1000 previstos para se mudarem este ano (em comparação com 8500 em 2022 e 2800 em 2023). O risco geopolítico também explica a migração de taiwaneses, dada a possibilidade de ocupação da ilha pela China.
De onde estão saindo esses migrantes HNWIs. Fonte: Henley&Partners
Os brazukas também deram as caras (ou melhor, tiraram as caras) no relatório: é projetado que em 2024, cerca de 800 HNWIs. Junto, no bonde dos que partem, vêm os sul-africanos, nigerianos e vietnamitas.
"Vai pá onde?"
O destino desses bolsos privilegiados é – surpresa! – países de alta renda. Destinos tradicionais como Estados Unidos e Suíça se destacam na lista (comprovando o ditado que primeiro vão os filhos, depois o dinheiro…), mas o topo do ranking ficou com os Emirados Árabes Unidos: o pequeno país do Oriente Médio atrai cerca de 6700 HNWIs, comprovante aquilo que a gente tem visto nas redes sociais: o dinheiro está fluindo para Dubai, e não é apenas devido ao petróleo e o turismo.
Depois vem destinos que estão muito ligados à origem dos migrantes: os chineses, sul-coreanos, taiwaneses e vietnamitas podem estar escolhendo seus países vizinhos ricos. Quem ganha é a Singapura (entrada líquida de 3500 HNWI), Austrália (entrada líquida de 3500 HNWI — embora esse possa estar sendo também o destino de muitos britânicos) e o Japão (+400 HNWIs).
Na Europa, tem recebido HNWIs a Itália, a Suíça, a Grécia e Portugal.
Agradando todos os gostos (e bolsos e culturas), também levou uma bolada de novos residentes HNWI Estados Unidos, segundo no ranking geral, e Canadá, que tem feito uma política bem agressiva de atração de novos residentes.
Para onde estão indo esses migrantes HNWIs. Fonte: Henley&Partners
E porque o topo do ranking ficou com os Emirados Árabes, ou melhor, Dubai? Bem, o ambiente fiscal do Dubai é um grande atrativo: a ausência de imposto sobre o rendimento de pessoa física permite que os HNWIs reduzem os custos fiscais e é uma vantagem em relação a outros centros financeiros globais, onde a carga fiscal é significativamente mais elevada.
O programa Golden Visa dos Emirados Árabes Unidos é outro fator que deu uma força para atrair os muito ricos: o visto de residência de longo prazo, permitindo que milionários vivam, trabalhem e invistam nos Emirados Árabes Unidos com restrições mínimas. O visto mudou o jogo, atraindo indivíduos ricos de todo o mundo que procuram um ambiente mais favorável para os seus bens.
Fora a questão da segurança pública e estabilidade geopolítica, que contrastam com os países de origem desses migrantes cheios de grana.
Deveríamos nos preocupar?
Essa é uma questão temperada de ideologias e emoções. Do lado dos que recebem esses ricaços, é quase só alegria. Os benefícios dessa migração de riqueza e talento para esses países são abrangentes e incluem itens como:
Receita cambial: milionários migrantes são uma fonte vital de receita cambial, pois tendem a levar seu dinheiro com eles quando se mudam para um novo país. Por exemplo, um migrante que traz US$ 10 milhões com eles é equivalente a um país gerando US$ 10 milhões em receita de exportação, pois ambas as transações geram US$ 10 milhões de receita cambial para o país.
Novos negócios: muitos indivíduos de alto patrimônio líquido que estão se mudando (cerca de 20%) são empreendedores e fundadores de empresas, que geralmente abrem negócios em seu novo país e, portanto, criam empregos locais. Essa porcentagem sobe para mais de 60% para multimilionários e bilionários.
Mercados de acionário: milionários impulsionam o mercado de ações local por meio de seus investimentos em renda variável. Além disso, alguns empresários de alto patrimônio líquido listam publicamente suas empresas na bolsa de valores local.
Geração de empregos: Talvez o mais importante, indivíduos de alto patrimônio líquido criam indiretamente milhares de empregos bem remunerados por meio de seu poder de compra, especialmente em setores de alto valor, como hotéis de luxo, restaurantes finos, varejo de luxo, moda, alta tecnologia, automotivo, imóveis de primeira linha, gestão de patrimônio e escritórios familiares.
Da parte de quem perde esses ricaços, é quase que o efeito oposto: perda de receitas tributárias, fuga de capital e de investimentos, e por aí vai.
Já em termos globais, esses movimentos acabam gerando o efeito bom-xibom-xibom-bom-bom: os ricos ficando mais ricos e os pobres ficando mais pobres, já que são os países mais ricos que atraem esses endinheirados. E, a se olhar pelo último Henley & Partners Global Wealth Migration, essa tendência vai continuar nos próximos anos…
Paraíso e Inferno
O ditado no mercado diz que “existem os paraísos fiscais e o Brasil”, indicando como o caos fiscal e tributário brasileiro é uma dor de cabeça. E isso não é recente, data desde o nossos tempos coloniais.
O que pouco se fala, porém, é que o Plano Real — idealizado para domar o dragão inflacionário que colocou a economia do Brasil até o início dos anos 90 — também teve que lidar com o problema fiscal.
Além das medidas de saneamento fiscal, saiu a famosa “Lei de Responsabilidade Fiscal”, como um dos produtos do Plano Real, depois que as medidas de reforma monetária e cambial haviam sido implementadas.
Isso tudo trouxe estabilidade e permitiu ao Brasil o crescimento que vimos nas últimas décadas. Mas e agora, e daqui pra frente?
Muita coisa pra resolver ainda, muito problema estrutural que fazem o Brasil ser o eterno país do futuro. Pensando nisso, a Inteligência Financeira produziu a série “De onde virá o próximo salto econômico do Brasil?”
Uma série sobre macroeconomia com quem está à frente de transformações, que trata de temas que estão no cerne do desenvolvimento do Brasil, como as contas públicas e o câmbio.
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